Vítimas de cárcere privado em clínica no Crato deverão receber R$ 390 mil em indenização
Ao todo, 34 mulheres eram mantidas presas em celas dentro do estabelecimento de repouso; proprietário deverá pagar indenização coletiva e individual para as ex-internas
As 34 mulheres encontradas em situação de cárcere privado em uma clínica de repouso no Crato, município distante 538 quilômetros (km) de Fortaleza, no ano de 2021, deverão receber em R$ 390 mil em indenização. A decisão foi tomada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJCE) no último dia 8 de abril, e prevê pagamentos coletivos e individuais pelos maus-tratos sofridos no local.
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Conforme decisão da 1ª Vara Cível da Comarca do Crato, o proprietário da Casa de Acolhimento Feminina Água Viva, Fábio Luna dos Santos, deverá pagar o montante de R$ 10 mil para cada uma das ex-internas, somado a uma indenização coletiva de R$ 50 mil, por danos morais.
Além da sanção financeira, tanto a instituição quanto Fábio estão proibidos de exercer qualquer atividade relacionada ao acolhimento, tratamento ou cuidado de pessoas com transtornos mentais pelos próximos cinco anos.
Na decisão, o juiz destacou que a existência de locais para o trancamento das mulheres configura situação de potencial restrição de liberdade das internas. Além disso, também foram consideradas as condições degradantes apontadas por investigação policial.
“Cada uma dessas mulheres sofreu danos específicos à sua personalidade, sendo submetidas a tratamento desumano que incluía confinamento em celas sem condições mínimas de habitabilidade, restrições severas de alimentação, obrigação de realizar trabalhos forçados, ausência de instalações sanitárias adequadas, além de abusos físicos e psicológicos”, afirmou José Batista de Andrade, juiz titular da unidade.
Mulheres em cárcere privado no Crato: relembre o caso
As denúncias contra a Casa de Acolhimento vieram à tona em 2021, quando uma das então internas conseguiu escapar do local e entregar um bilhete a sua família, contanto que era mantida privada de liberdade em uma cela.
O fato resultou em uma operação policial na Instituição, na qual foi constatado que as mulheres só podiam sair das celas para realizar atividades domésticas.
Entre as tarefas compulsórias estavam lavar pratos, recolher lixo, capinar mato com as próprias mãos, rasgar livros para reciclagem e retirar fezes e urina das celas.
A investigação também apurou que as famílias das vítimas eram proibidas de entrar nos locais onde elas eram mantidas em privação de liberdade, a fim de evitar que os danos fossem descobertos.
“A privação de liberdade, associada às condições sanitárias precárias, caracteriza grave violação à dignidade humana, ferindo não apenas os direitos individuais das internas, mas também os valores coletivos de proteção às pessoas vulneráveis, especialmente aquelas com transtornos mentais”, pontuou Andrade.
Por fim, foram encontrados indícios de discriminação das mulheres por condição financeira, já que as detentoras de melhores condições financeiras ficavam dentro de casa, enquanto as mais pobres eram trancadas nas celas.
Durante a investigação, o réu negou que as mulheres eram mantidas em cárcere privado e afirmou que as visitas de familiares foram restringidas apenas durante a pandemia de Covid-19.
Sobre as tarefas domésticas, Fábio alegou que as únicas atividades às quais as internas eram submetidas se relacionavam a terapia de grupo ou individual, acompanhadas por profissionais habilitados.
Defendeu também que, antes de o contrato, os familiares visitavam as dependências da casa de acolhimento e que, periodicamente, órgãos de fiscalização e controle do Poder Público realizavam vistorias, de modo que o local funcionava sob as cautelas da lei.
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